Sinal fechado para o “Semáforo do Comportamento”: pare, olhe e escute a sua criança!
Sinal fechado para
o “Semáforo do Comportamento”: pare, olhe e escute a sua criança!
Dra. Cassiana Magalhães
Dra. Juliana C. Pasqualini
Vivemos tempos difíceis, é fato. Na escola não é diferente. A queixa dos
professores é que as crianças estão cada vez mais agitadas, desinteressadas,
desatentas. O manejo das turmas no cotidiano da escola vem se mostrando
altamente desgastante para grande parte do professorado, inclusive na educação
infantil. Diante desse cenário, profissionais buscam avidamente por soluções e
estratégias que minimizem esse desgaste. Assim adentra nossas escolas uma
técnica que promete auxiliar no controle do comportamento das crianças, o assim
chamado “Semáforo do Comportamento”.
A técnica é relativamente simples: confecciona-se um semáforo, que fica exposto
em uma parede da sala, e os nomes das crianças são diariamente alocados na cor
verde, amarela ou vermelha de acordo com a avaliação da professora sobre seu
comportamento. Verde para bom comportamento, amarelo para alerta, vermelho para
mau comportamento.
Qual seria o mecanismo por trás dessa técnica a embasar a promessa de controlar
os problemas de indisciplina na escola? A expectativa parece ser que, por medo
de ser classificada no sinal vermelho, a criança passe a apresentar bom
comportamento. Ou ainda que se esforce para ter bom comportamento por desejo de
ser recompensada e reconhecida com seu nome no sinal verde. Uma alternativa
aparentemente simples, rápida, supostamente eficaz. Em uma busca rápida na
internet encontramos vários modelos de “como fazer”.
Sempre que nos
deparamos com soluções simples e rápidas para problemáticas complexas, devemos
nos inquietar e suspeitar. Sempre que adotamos uma estratégia pedagógica nova,
devemos refletir sobre seus fundamentos e seus efeitos. O “Semáforo do
Comportamento” é um sistema de ameaça-punição-recompensa que nem mesmo a
Psicologia Comportamental contemporânea aprova. Há toda uma literatura que
mostra quão problemática é a escolha de controlar o comportamento alheio
utilizando estratégias de coerção (ameaça e punição), pois isso, além de
inefetivo, gera efeitos colaterais muito preocupantes, especialmente no
contexto escolar. Basta imaginar: como se sente uma criança que tem seu nome
recorrentemente classificado no sinal vermelho? Tal situação pode desencadear
um quadro de ansiedade na criança, que passa o dia sob tensão e medo de ter
novamente seu nome exposto, para toda a sala, como alguém incapaz de atender
aquilo que a professora espera. Essa tensão pode evoluir para um quadro de
tristeza ou raiva, pelo sentimento de inferioridade que provoca, levando a um
embotamento da criança ou, paradoxalmente, a um aumento nos comportamentos
agressivos e “indisciplinados”. A expectativa do julgamento público ao final do
dia pode, inclusive, desviar o foco de atenção das crianças da própria
aprendizagem escolar, daquilo que realmente importa na escola!
Um outro aspecto
dessa prática que precisamos considerar é que ela se baseia no princípio da
concorrência. É como se, mesmo sem ter essa intenção, colocássemos as crianças
em uma competição, incentivando a comparação entre elas. O fato de a professora
condenar uma criança publicamente perante o grupo autoriza atos de humilhação
entre elas, pois faz aquelas que foram premiadas com a cor verde sentirem-se
superiores às que foram castigadas com a cor vermelha. Movimento semelhante
ocorreria se fosse instituído, pela direção da escola, um Semáforo do
Comportamento para os professores. Isso certamente seria enquadrado como
assédio moral no trabalho.
Por tudo isso
clamamos: abaixo ao Semáforo do Comportamento! Temos, sim, um desafio enorme a
enfrentar relativo à educação da conduta de nossas crianças. Mas devemos
enfrentá-lo buscando alternativas que potencializem o senso de coletividade e
de ajuda mútua, enriquecendo a experiência infantil na escola. Se nossas
crianças andam muito agitadas e desatentas, precisamos transformar as condições
de vida e educação que estão produzindo essa forma de comportamento. Mecanismos
simplistas de recompensa-ameaça-punição não resolverão nosso problema e farão
de nós profissionais que contribuem para a perpetuação de relações sociais
baseadas no medo e na competição.
Pare a sua rotina por um
momento, olhe para sua realidade, observe as relações que
estabelece com seu grupo, escute as crianças. Será que o modo
de promover a aprendizagem está interessante? Será que a forma de conversar com
as crianças convida para o diálogo ou apenas o professor tem voz e vez?
Será que o planejamento tem mobilizado nas crianças o desejo de aprender? Será
que temos ajudado nossas crianças a perceber e auto-regular suas próprias emoções?
Será que temos cultivado um ambiente acolhedor para todas, fomentando o
processo grupal?
Sinal fechado para o “Semáforo do Comportamento”: pare, olhe e escute a sua criança!
Reviewed by Blog Baguncei
on
setembro 02, 2019
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